Quando a notícia se espalhou que Notre Dame estava a arder, milhares de pessoas concentraram-se o mais perto que puderam da catedral. Rostos desfeitos, vozes embargadas, figuras ajoelhadas entoavam cânticos e preces enquanto o céu se deixava invadir pelo fumo e a catedral era consumida pelo fogo. Mais de 800 anos de história devorados num par de horas perante a perplexidade da multidão.
Nayara Guedes é cantora lírica e médica, uma presença habitual na Catedral de Notre-Dame. Perante a notícia apocalíptica que o monumento estava a arder, a brasileira não conseguiu ficar em casa e como milhares de pessoas passou o início da noite desta segunda-feira a olhar para as chamas que devastavam um dos monumentos mais visitados do mundo. A sensação era de incredulidade e “não acreditar que isso pudesse estar a acontecer”.
“Sou brasileira e a gente teve um incêndio histórico como esse há pouco tempo no Museu Nacional. A sensação que dá é que é um pedaço de história que está indo junto e que por mais que seja reconstruído, muita coisa se perdeu. É um sentimento de perda, uma tristeza de uma história perdida. É um símbolo não só de Paris, é um património mundial”, afirmou.
Quando a notícia se espalhou que Notre Dame estava em chamas, milhares de pessoas encheram as ruas, pontes e praças em torno da Île de la Cité. Rostos desfeitos, olhos aguados, figuras ajoelhadas a entoar cânticos e preces enquanto o céu se deixava invadir pelo fumo e a catedral se consumia num fogo voraz. Mais de 800 anos de história devorados num par de horas perante a perplexidade da multidão.
Joana Gomes também não conseguiu ficar em casa e precisou de se juntar a mais parisienses num momento quase de luto histórico que descreveu como “decadência absoluta”: “É um acontecimento extremamente trágico e não conseguia ficar em casa sem fazer nada, então decidi vir aqui ver e também para ver as pessoas, para não estar sozinha. É tipo o incêndio da Biblioteca de Alexandria.”
Quem também não quis ficar sozinha em casa e precisou de ver para crer foi Natalia Belucci, vizinha de Notre-Dame: “Eu não conseguia acreditar que era verdade (…) É um dos lugares mais bonitos da França e eu precisava de vir para ver. É um pedaço da história que se apaga, uma parte da história que se apaga, uma parte da história que se perde.”
Tristeza e incompreensão estavam também espelhadas no rosto de Catarina Cerqueira, estudante de mestrado em Paris. “Eu sempre adorei esta cidade e para mim é o maior símbolo desta cidade porque há imensa história lá dentro”, resumiu, prometendo que volta a entrar em Notre-Dame “para ajudar a reconstruir”.
Reconstruir o que demorou a construir cerca de 200 anos numa primeira fase. A Catedral de Notre-Dame é um dos edifícios mais audaciosos do século XII e um dos mais antigos monumentos franceses de estilo gótico.
Em 1831, o escritor Victor Hugo transforma-a no templo do povo e torna-a na célebre protagonista de um dos romances mais traduzidos no mundo, Notre-Dame de Paris. Um renascimento de uma lenda materializado pelo vasto e polémico restauro do arquitecto Viollet-Le-Duc que reinterpretou pouco depois a traça neogótica da catedral e construiu, por exemplo, o imenso pináculo que agora desabou sob as chamas.
Depois do drama, políticos e mecenas prometem reconstruir Notre-Dame, uma convicção repetida pelo vereador-executivo da Câmara de Paris, Hermano Sanches Ruivo. “É evidente que temos de reconstruir Notre-Dame. É evidente que vamos reconstruir Notre-Dame”, garantiu o franco-português, sublinhando que “é um monumento francês, europeu e mundial”.
As sirenes soaram mais alto que as preces. Mais de 400 bombeiros tentaram salvar a catedral e as torres da fachada principal mantiveram-se intactas. Ainda assim, as perdas são incalculáveis e o esplendor dos vitrais das rosáceas ou das pinturas seculares deu lugar à desolação de uma página de história que ardeu a 15 de Abril de 2019.
“É horrível, é medonho, é incompreensível. E há raiva. Como é que é possível que o fogo tenha alastrado tao rápido e que não tenha havido alertas imediatos? Estamos totalmente arrasados”, lamentou Isabelle Eon.
“É como se assistíssemos ao fim de qualquer coisa. Não sabemos se vão reconstruir alguma coisa. Mais vale estar aqui e ver o último sopro de algo histórico”, acrescentou o seu filho Emmanuel Hadad.
“Muita tristeza. Estou a chorar há uma hora. Para mim é um símbolo de Paris. Representa o espirito de França de resistir perante a história”, descreveu a espanhola Mar, que está em Paris a fazer Erasmus.
“Meu Deus. Que catástrofe! A maior parte do edifício é de pedra, mas também tem muita madeira que ardeu. Que Deus abençoe todos e ainda bem que não há vítimas”, afirmou Chris Landekens.
“É a morte da Nossa Grande Senhora. É muito comovente e é importante estar aqui. É o símbolo de Paris por excelência, tem mais de 800 anos. O símbolo de Paris não é a Torre Eiffel, é a Notre-Dame. É um grande luto”, concluiu Elza Olivier.
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