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República Democrática do Congo

Congo Hold-up: a mais importante fuga de documentos bancários de África

A rede europeia de jornalistas e investigadores 'European Investigative Collaborations' (EIC) da qual fazem parte 19 órgãos de comunicação social, entre os quais a RFI, começou a divulgar hoje os resultados de um longo inquérito intitulado 'Congo Hold-up' dando conta de importantes desvios de fundos dos cofres do Estado congolês presumivelmente cometidos pelo antigo presidente Kabila e pessoas do seu primeiro círculo.

O antigo presidente congolês, Joseph Kabila.
O antigo presidente congolês, Joseph Kabila. © RFI
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De acordo com este inquérito que se baseia em milhões de documentos bancários e transacções provenientes da BGFI, um banco cujo nome ficou associado, no passado, a escândalos de desvios de fundos públicos, o ex-presidente Joseph Kabila que esteve no poder na RDC entre 2001 e 2013, familiares seus e alguns de seus associados mais próximos terão sido responsáveis do desvio de pelo menos 138 milhões de Dólares dos cofres do Estado congolês no período 2013-2018.

Segundo a investigação, este desvio cujo valor equivale a 250.000 anos do salário médio num país onde 70% da população vive com menos de dois dólares por dia, foi concretizado com a ajuda activa do banco comercial BGFI, baseado no Gabão e activo em dez países africanos.

No decurso da pesquisa do consórcio, descobriu-se igualmente que mais de 100 milhões de Dólares adicionais foram creditados nas contas dos membros do círculo próximo do ex-chefe de Estado, sem que seja possível determinar a sua origem. 33 milhões de Dólares foram depositados em dinheiro e 72 milhões vieram da conta que o BGFI tem junto do Banco Central do Congo (BCC).

A sucursal do BGFI na República Democrática do Congo é tida como o banco da família Kabila. Em 2010, quando a filial deste banco abriu na RDC, a irmã mais nova de Joseph Kabila, Gloria Mteyu, recebeu de oferta 40% do capital. Em 2013, o irmão adoptivo do então presidente, Francis Selemani Mtwale, assumiu as rédeas do banco. Foi quando ele se tornou director-geral da instituição que os desvios financeiros se intensificaram, segundo os investigadores do 'Congo Hold-up'.

Este banco já se ilustrou no passado por estar ligado a escândalos de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo líderes africanos e empresas europeias, nomeadamente o caso dos "bens mal adquiridos" da família presidencial do Gabão nestes últimos anos, sendo que a actuação deste banco foi denunciada em 2016 por Patrice Emery Lumumba, antigo funcionário do banco naquilo que ficou conhecido como "Lumumba papers".

Mais de 3,5 milhões de documentos

Com mais de 3,5 milhões de documentos internos do BGFI, bem como milhões de transacções que abrangem um período de cerca de dez anos, o 'Congo Hold-up' é uma imersão inédita num sistema que estende as suas ramificações por todo o globo.

A história de 'Congo Hold-up' não é apenas uma história congolesa. O BGFIBank RDC atraiu todos quantos procuravam influenciar o então presidente e, em particular, as empresas estatais chinesas envolvidas em megaprojectos de mineração no país.

Esta pesquisa identifica políticos congoleses de todos os quadrantes e empresários, na sua maioria estrangeiros, que poderão ter enriquecido em detrimento de um Estado fraco. 'Congo Hold-up" revela nomeadamente que o Banco Central do Congo não chegou a desempenhar o seu papel de regulador do sistema bancário nacional.

Os dados recolhidos pelos investigadores tendem a comprovar que, pelo contrário, esta instituição incentivou a fraude e o peculato, sendo que foi igualmente necessária a cumplicidade de instituições congolesas, em cada etapa dos desembolsos e contratações públicas. Os órgãos de controlo do Estado e as firmas de auditoria não conseguiram revelar a extensão dessa fuga de capital público nem contê-la. Os serviços de conformidade dos bancos envolvidos nas transacções levaram semanas ou por vezes até meses para bloquear os fluxos financeiros duvidosos.

Dada a quantidade colossal de dados a serem analisados, essa investigação de interesse público só pôde ser levada a cabo através de uma aliança sem precedentes entre jornalistas e pesquisadores. Durante nove meses, a rede 'European Investigative Collaborations' (EIC) e os seus 19 parceiros, entre os quais a Rádio França Internacional (RFI), colaboraram com um grupo de cinco ONGs especializadas na RDC ou nas pesquisas económicas (PPLAAF, The Sentry, GEC, Resources Matters, Public Eye).

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