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Vida em França

As pérolas da “Modernidade Portuguesa” em exposição em Yerres

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Até ao final do mês de Outubro a Casa Caillebotte, nos arredores de Paris, acolhe a exposição "Modernités Portugaises”. A história do modernismo português tem como curadora Anne Bonnin. Abrangendo um longo período, desde os anos 1910 até aos anos 1960, a exposição conta a história do modernismo português, na qual o poeta Fernando Pessoa é uma figura central e o seu principal fundador. Um movimento que se desenvolve entre Portugal e Paris.

Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992) O grande quarto azul, 1951. Dijon, Museu de Belas Artes
Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992) O grande quarto azul, 1951. Dijon, Museu de Belas Artes © DR
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Até ao final do mês de Outubro a Casa Caillebotte, em Yerres, arredores de Paris, acolhe a exposição "Modernités Portugaises”, “Modernidades Portuguesas”. Desde os anos 1910 até aos anos 1960, a exposição conta a história do modernismo português. Anne Bonnin é a curadora da exposição. 

Abrangendo um longo período, desde os anos 1910 até aos anos 1960, a exposição conta a história do modernismo português, na qual o poeta Fernando Pessoa é uma figura central e o seu principal fundador. Um movimento que se desenvolve entre Portugal e Paris. A capital francesa, como centro artístico internacional desde o século XIX, acaba por atrair os portugueses em busca de modernidade. 

Uma história pouco conhecida, que agora a curadora Anne Bonnin traz à ordem do dia. Com mais de uma centena de obras de artistas portugueses, uns conhecidos em França e outros menos, esta exposição acaba por fazer o visitante viajar e a pensar a história da arte, fora das suas grandes figuras. 

Desde o início do século XIX que os artistas de diferentes latitudes procuram em Paris modernidades. Os portugueses não fogem à regra. A correspondência estabelecida entre 1912 e 1916, entre Fernando Pessoa e o poeta Mário de Sá-Carneiro, instalado em Paris, constitui o primeiro modernismo português. Os artistas desta exposição que integram este primeiro modernismo são Amadeo de Souza-Cardoso, José Almada Negreiros, Santa Rita Pintor e Eduardo Viana. 

Esta exposição centra-se no modernismo português. O modernismo apareceu, mais ou menos, no início da década de 1910 e corresponde à ascensão integral das vanguardas internacionais e parisienses. Paris é o centro internacional da época e, por isso, muitos artistas vão a Paris nos anos 10. Um movimento migratório de intelectuais e artistas que foi em grande parte iniciado no final do século XIX.

A exposição começa nos anos 1910, é o primeiro modernismo que é encarnado por algumas figuras não muito numerosas. Amadeo Souza-Cardoso, Santa Rita Pintor, José de Almada Negreiros, Eduardo Viana, Fernando Pessoa… Pessoa que é a grande figura inspiradora deste primeiro modernismo com o seu amigo Mário Sá-Carneiro, poeta também. 

Os dois de alguma forma teorizaram e conceberam o desejo de um Modernismo, que o modernismo aparecesse em Portugal. Que uma arte moderna, uma poesia moderna pudesse ganhar forma em Portugal. 

Este modernismo é desenvolvido através da correspondência entre Fernando Pessoa, que permanece em Portugal, e o seu amigo Mário Sá-Carneiro, que vem para Paris.

No que diz respeito aos artistas, Amadeo de Souza Cardoso é provavelmente a figura mais conhecida, Santa Rita Pintor, uma figura bastante singular, um tipo de “cometa” que se rendeu muito cedo ao cubismo e do qual temos poucas obras, porque morreu jovem e mandou destruir os seus trabalhos. Almada Negreiros que nesta aventura do modernismo participa mais como escritor na revista Orpheu, fundada por Pessoa e Sá-Carneiro. Claro, Eduardo Viana que vai fazer uma carreira, um caminho diferente, por isso é interessante. São percursos muito diferentes que nos fazem entrar numa história.

A exposição reúne artistas que vieram a Paris à procura da arte contemporânea. Apesar de todos procurarem o modernismo, cada um deles tem uma relação singular com a arte da época. 

"Aqui temos um Eduardo Viana raro, que faz parte dos tesouros do modernismo, estamos diante de uma pérola rara. Plasticamente, este trabalho é único na obra de Viana. É uma manta de retalhos de peças em tecido, infelizmente vemos que perdeu algumas, pelo que é a composição de uma figura de tipo cubista com uma colagem. Vemos macramé e especialmente este patchwork de cores. É claro, pensamos em Sonia Delaunay e nos seus famosos retalhos.

Ali Amadeo de Souza Cardoso pintou uma série de janelas, janelas que são de facto figurativas mas também quase abstractas e cúbicas. Mas aqui, não é cubismo, vemos um conjunto de cubos, por isso as janelas.

Amadeo morreu muito jovem com a gripe espanhola, teve uma carreira deslumbrante, uma produção muito prolífica e intensa num período de tempo muito, muito curto. 

Estas são as últimas pinturas de Amadeo. As cores são muito frescas porque após a sua morte, a sua mulher guardou as obras. Foram preservadas, aparentemente, debaixo de uma cama, não viram a luz do dia durante décadas. Daí a frescura das cores. Vemos nestes quadros um Amadeo a experimentar, ainda está num vocabulário um pouco cubista, mas liberta-se, é uma composicional extremamente livre. Encontramos elementos parisienses, uma caixa registadora, uma guitarra, elementos eróticos e um corpo feminino.

O que vemos é a riqueza das técnicas, há uma colagem de variedades de espelhos, tecidos, variedade de técnicas. Vemos que há um gozo muito forte na pintura e que entrava numa nova fase de composição. 

Vamos para a outra sala. É o retrato de Pessoa que nos acolhe. Este retrato foi feito por Almada Negreiros, inspirado num desenho que tinha feito na morte de Pessoa, inspirado pelo seu rosto morto.

Subimos as escadas e duas salas dedicadas ao casal  Maria-Helena Vieira da Silva e Árpád Szenes. Dois importantes artistas do pós guerra que encarnam a Paris cosmopolita. Um diálogo excepcional com obras únicas que testemunham a cumplicidade afectiva e artística do casal.

Vieira da Silva chega a Paris muito jovem, aos 20 anos. Conheceu Árpád rapidamente e casou-se em 1930. Nesta sala mostro obras que evocam tanto o estúdio, como o diálogo dos artistas e o seu trabalho pessoal. Duas obras predominam, dois grandes formatos, o retrato de Árpád por Vieira. Magnífico! O retrato bastante típico dos muitos retratos que Arpad fez de Vieira, que é o retrato da poltrona e que se torna uma espécie de emblema. Vieira é, muitas vezes, corpo na sombra de retratos com a sua famosa poltrona de vime. 

É um magnífico retrato que faz fronteira com a abstracção, mas que não é abstracto e que é muito bonito. Ela nunca dá o passo da abstracção. Há obras abstractas, mas há sempre um elemento de uma relação com uma realidade, por exemplo, nesta mesa redonda, temos a impressão de ver, uma abstracção, mas na verdade, por trás destes motivos abstractos vemos uma cena como uma biblioteca, uma mesa."

A fechar a exposição, dois nomes, muito ligados a França, mas desconhecidos: Mário Cesariny e António Dacosta que integram o movimento surrealista. 

Aqui um artista que veio para se estabelecer em França a partir de 1947: António Dacosta. Quando chegou a Paris conheceu os seus grandes mestres e entrou em choque e pára de pintar. 40 anos mais tarde, começou um período completamente diferente. Finalmente, distancia-se deste modernismo e vai para outra coisa. Aqui fez um retrato de Pessoa. Vemos esta imagem meditativa, muito melancólica. É por isso que falo de um período pós-moderno que se chama um regresso à pintura e, de qualquer forma, com outra história também. Outra relação com a pintura que já não é a da vanguarda. 

É uma grande mudança. Nesta segunda fase não há cor. É uma escolha, mas é verdade que os tons são muito mais silenciados.

Até ao final do mês de Outubro a exposição "Modernités Portugaises” está patente na Casa Caillebotte, em Yerres, nos arredores de Paris. Estão expostas as obras de Sarah Affonso, José de Almada Negreiros, Mário Cesariny, António Dacosta, Robert Delaunay, Sonia Delaunay, Ofélia Marques, Santa Rita Pintor, Amadeo de Souza-Cardoso, Árpád Szenes, Eduardo Viana e Maria Helena Vieira da Silva.

A exposição integra a programação da Temporada Cruzada Portugal-França. 

Neste momento Anne Bonnin assume igualmente a curadoria da exposição  “Les Péninsules Démarrées”, o panorama da arte contemporânea portuguesa desde 1960, patente até ao dia 26 de Fevereiro de 2023, no Frac Nouvelle-Aquitaine MÉCA – Bordéus.

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